Uma pesquisa da McAfee, da qual
todos os jornais estão falando, chegou à conclusão de que o fenômeno
do spam, ou seja, daquelas mensagens indesejadas que nos enviam por
e-mail, resulta num enorme consumo de energia. Uma única mensagem
gera 0,3 gramas de dióxido de carbono, o que equivale às emissões de
um carro que percorre um metro na estrada.
Ao que parece, todo o spam em circulação consome 33 bilhões de
kilowatts-hora de energia por ano, o que equivaleria ao consumo de
três milhões de carros ou dois milhões e meio de casas. Isso gera um
efeito estufa de 17 milhões de toneladas de gás carbônico. Pulo
outros detalhes técnicos e me limito a observar que o spam,
portanto, não é apenas um incômodo e uma forma frequente de nos
roubarem informações, ele também tem uma influência negativa sobre
nossa saúde.
Pelo visto, nenhuma autoridade do mundo é capaz de reduzir o spam,
nem os filtros que costumamos ativar servem para muita coisa: muitas
mensagens não desejadas acabam passando e parece que o maior
desperdício de energia consiste exatamente em abrir essas mensagens
ou eliminá-las manualmente.
É inevitável ficar com raiva disso tudo, e comecei a pensar no que
podemos fazer para nos defendermos. Na falta de uma alternativa
melhor, fiquei com vontade de me vingar. Foi então que tive uma
ideia, e naturalmente espero que centenas de especialistas me
respondam para demonstrar que ela é inviável ou prejudicial, mas já
aviso que jogarei esses e-mails no lixo (considerando-os spam), uma
vez que só pretendo lançar uma provocação.
Bem, vamos dividir os autores de mensagens não desejadas em dois
grupos: os chatos industriais, ou profissionais, e os chatos
artesanais, ou amadores.
Imagino que os chatos industriais tenham muitos meios para
neutralizar meu protesto, mas há milhares de chatos artesanais, como
aqueles que, num português duvidoso, informam que ganhamos um prêmio
e pedem nossos dados, ou aquele malaio que diz ter recebido uma
herança enorme que por algum motivo não conseguiu sacar e nos
oferece 50% de participação para ajudarmos a recuperá-la, depois, é
claro, de enviarmos algum dinheiro como garantia, etc, etc.
Os chatos amadores talvez nem tenham banda larga. Se já aconteceu de
você receber um livro inteiro de 600 páginas, cheio de fotos
coloridas, enquanto não estava em casa, mas numa pousada ou numa
casa de campo sem banda larga, deve saber que, para descarregar
tamanho lixo, o computador fica bloqueado por pelo menos uma hora.
Agora, para esse tipo de chatos, poderíamos responder enviando a
Bíblia de Jerusalém. Ela pode ser encontrada em italiano no site
http://www.liberliber.it/biblioteca/b/bibbia/index.htm, e do
jeito que está lá tem 1.226 páginas e pesa 11.574 KB. Mas, se em
dois segundos mudarmos o formato para espaço duplo e corpo 20, ela
fica com 6.556 páginas e mais de 14.000 KB. Não é nada mal: se você
tem banda larga, pode enviá-la em poucos minutos, do contrário, pode
fazer com que o computador trabalhe de noite. Se quem recebe não
tiver banda larga, terá alguma dificuldade. E se eu não fosse o
único a enviar, mas centenas de usuários fizessem a mesma coisa, o
desgraçado ficaria praticamente imobilizado.
Sei que fazer isso contribuiria para aumentar a poluição. Claro que,
se por acaso, depois de algumas semanas, esta resposta convencesse
uma certa quantidade de chatos a desistirem, sairíamos no lucro, e o
preço energético pago seria menor do que o ganho final. E além
disso, pereat mundus [faça-se a justiça ainda que o mundo pereça], o
prazer da vingança é maior do que esses cálculos mesquinhos.
Naturalmente, sem muito esforço, o plano ainda pode melhorar. A
cópia em PDF da edição de 1551 da “Retórica” e da “Poética” de
Aristóteles tem mais de 37 mil KB, as mesmas dimensões da “Summa
Theologica” em edição bilíngue. A “Anatomy of Melancholy” de Burton
em PDF chega a 32 mil KB, e só “Os mistérios de Paris” de Sue, na
edição francesa, tem 76.871 KB, quase seis vezes o tamanho da
Bíblia. Se, além disso, você tiver um computador eficiente e
colocá-lo para trabalhar à noite, pode mandar todos os textos que eu
citei, de uma vez.
Por fim, depois de receber alguns milhares de Bíblias ou de
Mistérios de Paris, até mesmo uma organização profissional pararia
para pensar duas vezes. Devo dizer que, para ver quanto tempo o
computador levava para baixar o arquivo, mandei a primeira Bíblia
para o meu próprio e-mail. Não consegui encontrá-la na caixa de
entrada, e me dei conta de que algum sistema de filtros a havia
enviado automaticamente para os “itens eliminados”. Mas acho que o
tempo para baixar é o mesmo, e portanto, o inconveniente para o
destinatário é tão grande quanto.
Por
Umberto Eco