Políticos da União Européia estão irritados com projeto polonês de
castração química de pedófilos
30 de novembro de 2008 | Autor: antonini
O primeiro-ministro
polonês Donald Tusk quer aprovar uma lei que imponha a “castração
química” de pedófilos. Políticos do Parlamento Europeu em Bruxelas
fizeram objeções à proposta, mas há pouco que a UE possa fazer para
impedi-la.
Christina Hebel
A princípio, parecia apenas um lapso de discernimento altamente
emotivo por parte do primeiro-ministro Donald Tusk, mas agora é
oficial. O governo polonês quer aprovar uma lei que force pedófilos
condenados a serem castrados quimicamente.
Um caso de incesto no subúrbio da cidade de Grodzisk, no Leste
polonês, gerou o atual debate. A polícia recentemente prendeu um
homem de 45 anos que teria abusado sexualmente de sua filha por seis
anos. Sua filha de 21 anos alega ter dado à luz a dois filhos do
pai.
A notícia chocou Tusk. “Não acredito que tais indivíduos, tais
criaturas, possam ser chamados de humanos”, disse ele. “Neste caso,
não dá nem para argumentar em nome dos direitos humanos”. Ele quer
impor a “castração química” como punição na Polônia. Em suas
palavras, a castração não seria “a pedido do condenado, e sim parte
do veredicto”. A punição forçada se aplicaria “principalmente a
pedófilos, particularmente àqueles que não têm esperança de
melhora”.
“Puro populismo”
O Ministério de Saúde e Justiça da Polônia está atualmente redigindo
as mudanças necessárias ao código penal do país, e Tusk espera que o
projeto de lei de castração forçada esteja pronto para avaliação
pelo Parlamento em outubro. “Quero introduzir as leis mais duras
possíveis contra criminosos que estupram crianças”, disse Tusk na
semana passada.
Christoph Joseph Ahlers vê o projeto polonês como “puro populismo”.
O psicólogo sexual é co-fundador do Projeto de Prevenção Dunkelfeld
do Instituto de Medicina Sexual, do Hospital de Charité em Berlim, e
trabalha como consultor terapêutico.
Também não estão claros quais seriam os alvos do projeto de lei do
primeiro-ministro Tusk. Em um momento ele fala de “pedófilos” e de
“criminosos que estupram crianças” e, no outro, são “condenados” que
precisam da castração forçada.
O psicólogo sexual Ahlers adverte sobre a confusão de termos. “A
pedofilia não é um ato criminoso, é uma doença na qual o interesse
sexual é dirigido a crianças”, diz ele. “Mas isso não significa que
todo pedófilo automaticamente abusa de crianças.”
Estudos conduzidos nos EUA mostraram que um terço dos criminosos
condenados por abuso de crianças são pedófilos. Dois terços atacam
crianças por outras razões, inclusive doenças como o alcoolismo. O
diário de esquerda polonês Gazeta Wyborcza, que se opõe à proposta
do governo, publicou essas estatísticas várias vezes. O jornal
também informou que o homem de 45 anos preso no Leste da Polônia não
tinha sido considerado pedófilo.
Uma combinação de psicoterapia e remédios
Também não está claro o que, exatamente, Tusk quer dizer com
“castração química”. De acordo com o psicólogo sexual Ahlers, há
três possibilidades para o tratamento médico de criminosos sexuais.
Certos antidepressivos são uma opção e os chamados anti-andróginos
são outra. Os dois são medicações que reduzem o desejo sexual.
Entretanto, uma classe de drogas normalmente administrada para
pacientes de câncer de próstata também pode ser usada para tratar
criminosos sexuais – são as únicas que tecnicamente seriam
classificadas como “castração química”. Elas “quase completamente
eliminam o desejo sexual, que permanece fraco após a administração”,
disse Ahlers. Os remédios não são aprovados oficialmente para o
tratamento de criminosos sexuais e só podem ser administrados com o
desejo expresso do paciente.
Reino Unido, Dinamarca, Suíça, Suécia e Alemanha já oferecem aos
molestadores de crianças a opção de “castração química”, mas apenas
de forma voluntária e administrada por um psicoterapeuta
qualificado. Na Alemanha, os criminosos sexuais têm direito legal a
psicoterapia.
O psicólogo sexual Ahlers critica a crença de que os remédios por si
sós resolvem a questão. “Forçar os pacientes a tomarem esses
remédios não seria o tratamento profissional correto”, diz Ahlers.
“O medicamento por si só não leva automaticamente a uma melhora do
controle do comportamento”. Ele aconselha uma combinação de
psicoterapia e medicação.
Na Alemanha, os democratas cristãos conservadores lutaram inúmeras
vezes pela adoção de “castração química”. O debate tornou-se
especialmente acalorado nos anos 70, depois da morte do criminoso
sexual condenado Jürgen Bartsch, que violentou e matou três
crianças. Para evitar a prisão perpétua em um hospital psiquiátrico,
Jürgen Bartsch optou pela castração. Em abril de 1976, enfermeiras
da sala de operação administraram dez vezes a quantidade normal de
anestesia, e Jürgen Bartsch morreu pouco depois da operação.
Ahlers adverte contra expectativas muito altas com a castração. “Até
mesmo homens castrados têm relapsos”, diz ele. Tudo depende do
acompanhamento da medicação com “psicoterapia qualificada”.
A União Européia não tem autoridade para impedir a castração
Na Polônia, o debate sobre a questão continua. Ativistas de direitos
humanos e especialistas jurídicos apontam que a constituição
polonesa proíbe a punição corporal. Eles também argumentam que a
terapia química forçada, contra a vontade do paciente, violaria as
leis internacionais e polonesas.
Apesar de a Polônia ser associada à União Européia, há pouco que
pode ser feito em Bruxelas para impedir o país de adotar a medida
penal. A UE “não tem autoridade porque o direito penal é uma questão
para os Estados membros,” diz Klaus Hänsch, membro alemão do
Parlamento Europeu e ex-representante do social democratas de
centro-esquerda. A pena de morte é a única punição expressamente
proibida pela União Européia, diz ele. No máximo, a União Européia
poderia condenar o plano com bases morais e éticas.
“Não acredito que essa castração forçada seria uma punição
apropriada compatível com o direito penal moderno”, diz o
especialista jurídico da UE.
Elmar Brok, membro democrata cristão alemão do Parlamento Europeu
também critica o projeto de lei chamando-o de “um instrumento
inadequado”. Os dois políticos disseram que acreditavam que seria
possível para os cidadãos poloneses questionarem a lei na Corte
Européia de Direitos Humanos em Estrasburgo.
Poloneses apóiam a idéia de Tusk
Entretanto, há uma boa chance de Tusk conseguir aprovar a
iniciativa. Na questão, o primeiro-ministro de centro-direita conta
com o apoio do presidente conservador Lech Kaczynski. Não é um apoio
qualquer, já que ele derrubou o irmão gêmeo de Kaczynski, Jaroslaw,
como primeiro-ministro nas eleições de outubro de 2007. Os partidos
de quase todas as tendências políticas do país estão pedindo a
adoção de punição mais dura para criminosos sexuais que abusam de
crianças.
Uma atitude conservadora ainda prevalece na sociedade polonesa hoje.
Uma recente pesquisa desenvolvida pelo jornal conservador Dziennik
mostrou que 84% dos poloneses apóiam o projeto de Tusk. Essa
aprovação não é comum para o primeiro-ministro e seu governo. Apenas
38% dos poloneses achavam que o governo estava fazendo um bom papel
depois dos primeiros 300 dias de Tusk no cargo, segundo as
pesquisas.
Entretanto, o apoio a Tusk e a seu governo cresceu desde então. De
acordo com uma pesquisa desenvolvida pelo jornal Gazeta Wyborcza de
Varsóvia, se os poloneses fossem às urnas neste final de semana, a
Plataforma Cívica de Tusk conseguiria 58% dos votos, um aumento de
10 pontos desde a última pesquisa, há duas semanas.