Do Windows ao Kurumin Linux
15 de novembro de 2008 | Autor: antonini
Uma viagem sem escalas e sem retorno.
Rogério Chociay
25/01/2007
Este artigo expressa minha
experiência com Linux, feita sobretudo com o Kurumin. Creio que
contém alguns comentários interessantes e úteis para os leitores
que estão ingressando no universo Linux.
Minha
experiência com Linux começou há cerca de três anos, quando
adquiri a revista de informática PCMaster número 80, que
apresentava como brinde um cedê do Linux Kurumin 2.12. Eu estava
atravessando uma fase bastante curiosa de minha vida profissional:
professor aposentado da UNESP, mas ainda vinculado à instituição
como orientador e professor de pós-graduação, estava bastante
insatisfeito com meus programas de computadores, que volta e meia
travavam, especialmente após atualizações, o que era para mim
terrível. Sem conhecimento de Informática, andei perdendo muitos
arquivos com os travamentos dos programas. Meu computador, um
velho PC133, Pentium III, 933 Mgz, tinha como sistema operacional
um Windows ME que eu adquirira numa loja de departamentos, com
atualização para XP, adquirido algum tempo depois. O ME já era
campeão em travamentos, mas após a atualização para XP o processo
ficou mais complicado ainda, e muitas vezes tive vontade de dar
chutes nas paredes ao perder arquivos e emails armazenados.
Provavelmente, tudo se devia a minha inabilidade de lidar com os
programas, e não, necessariamente, aos sistemas operacionais em si
mesmos.
Ora, quando coloquei o live cd do Kurumin 2.12 no drive e
reiniciei o computador, nada aconteceu: entrou simplesmente o
velho Win. O fato me forçou a ler com atenção o artigo da revista,
e pude aos poucos entender. Hoje percebo que naquele instante
estava deixando de ser um analfabeto em Informática e começava a
ingressar no mundo fascinante do Linux.
Quando o Kurumin 2.12 finalmente entrou, com a melodia
característica de inicialização, fiquei estupefato. Aquela tela
brilhante, de paisagem de crepúsculo (ou alvorada), assustou-me um
pouco, e confesso que nada fiz, senão desligar depois de alguns
minutos sem fazer nada, com medo de estragar meu computador, se
mexesse demais e erradamente no Kurumin (esta é uma das principais
preocupações, hoje eu diria “superstições”, do usuário iniciante).
Disse para mim mesmo, na ocasião, que Linux era um negócio
complicado e que eu jamais conseguiria entender, se não fizesse um
curso. Somente dois ou três dias depois minha curiosidade me fez
ativar novamente o live cd, isso depois de reler o artigo da
revista. Desta vez já entrei animado, com informações importantes,
e arrisquei-me a navegar pelo programa, inclusive brincando com
alguns games. No início fiquei agradavelmente surpreso com a
quantidade de programas, o que no outro sistema seria impensável
sem desembolsar um bom dinheiro. Em resumo: minha segunda
experiência foi fascinante, mexeu realmente com minha curiosidade,
minha imaginação e minha vontade de deixar de ser um simples
usuário autômato para me transformar num usuário realmente ativo.
Quando, depois de alguns dias, resolvi fazer a experiência da
instalação, percebi, gratificado, que estava fazendo uma escolha
acertadíssima. O fato de o Linux ser gratuito enquanto o outro
sistema operacional custa um preço escorchante deixava de ser uma
das motivações principais para ingressar no universo Linux. Não
era mais só questão de dinheiro, mas de satisfação pessoal, de
sentir-me ativo e capaz de operações que, antes, tinha de levar a
um especialista e pagar o preço. A instalação do Linux Kurumin me
surpreendeu: facílima, didática, sem possibilidade de cometer erro
grave. O particionamento pelo Fdisk ou pelo Qparted funcionava sem
quaisquer problemas, ou, quando dava, era provocante procurar
resolvê-los: formatar deixou de ser para mim um palavrão e passou
a ser uma operação instigante; termos como montar, desmontar,
descomentar me provocavam experiências novas. Até os erros que eu
cometia eram gostosos, pois me levavam a novas descobertas. Levei
algum tempo para ter coragem de instalar o diretório home numa
partição separada, mas, quando o fiz, percebi que nunca mais
perderia meus arquivos e emails.
Foram tantas as satisfações de usuário que percebe estar deixando
a passividade e começando a “dominar a máquina”, que se torna
difícil destacar uma delas. Creio, porém, que a conexão com a
Internet foi vital para minha decisão futura. O Kurumin, por
princípio, carrega consigo os principais drivers de instalação dos
winmodems, e ao descobrir isso, e ao descobrir como era fácil
acionar esses drivers, percebi que a viagem no Linux seria
prazerosa. De fato, esta é uma característica do Kurumin que nunca
me cansarei de louvar. Ouso afirmar que muitos usuários que
experimentam outras distribuições Linux desistem ao perceberem
como será complicado instalar drivers de winmodems ou softmodems.
As reclamações verificáveis em qualquer forum de usuários o
demonstram. O Kurumin, inteligentemente e com grande perspicácia
das carências do usuário, facilitou tudo, possibilitando a
instalação do dispositivo de fax-modem com um simples clique.
Creio que os mentores do Kurumin tiveram ainda outra motivação,
altamente louvável, para disponibilizar os drivers: o fato de que
provavelmente a maioria dos brasileiros não dispõe ainda de
conexão em banda larga, mas apenas por via telefônica e por meio
da placa de fax-modem. Era exatamente esse meu caso na época, já
que a banda larga não chegava em condições técnicas adequadas até
minha residência. Sem o Kurumin e seus drivers, meu ingresso no
universo Linux teria demorado ainda uns dois anos. Certa
distribuição nacional fez exatamente o contrário: tentou impor um
tipo específico de modem, que, curiosamente, é caro e quase
impossível de se encontrar no mercado. Com isso simplesmente
perdeu todos os usuários que têm placas de fax-modem no
computador. Ou talvez não os queira, embora isso não combine com a
filosofia Linux.
Quando já me acostumava com o Kurumin 2.12, chegou o 3.0 e mais
coisas para aprender. Na versão 3.0 que instalei em meu computador
não aparecia o ícone do disquete. Descobrir por que e como fazer
para funcionar ou “montar” me levou a novo aprendizado.
Entusiasmado, passei a fazer parte da promoção do Guia do
Hardware, enviando uma importância e recebendo periodicamente as
novas versões que iam surgindo. E fui experimentando todas,
atualizando minha máquina, errando, acertando, reclamando de
algumas alterações que demorava para perceber como funcionavam.
Essa mudança de hábito causada pelo universo Linux trouxe-me
outra, também empolgante: criei coragem e fiz o que sonhava havia
algum tempo: montei sozinho um computador. Isso, para um professor
de Língua Portuguesa e Literatura não foi simples, teve alguns
percalços, mas ao cabo de seis meses de leituras e releituras
montei meu melhor computador do zero, comprando peça por peça e
arriscando perder tudo numa manobra desastrada: placa Asus
A7V8X-X, processador Athlon XP 2.400+, placa de vídeo GeForce,
etc. Felizmente, não fiz nenhuma manobra desastrada e o computador
funciona até hoje sem “dar pau”, como se diz na gíria da
Informática.
Após todo esse processo de aprendizagem, criei mais coragem e
experimentei praticamente todas as principais distribuições Linux
atuais. Gostei bastante de algumas, mas sempre que tentei usá-las
alternativamente ao Kurumin, percebi que haveria algum tipo de
perda, em virtude, provavelmente, da familiaridade que passei a
ter com essa distribuição, particularmente pela facilidade de
operar o Lilo para configurar o menu de inicialização para todas
as partições.
Contando agora com Internet banda larga, via DSL, tenho baixado as
versões 6.1 e 7.0b com grande facilidade. Como tenho quatro
computadores em casa conectados em rede doméstica (o que é
facílimo com o Kurumin Linux e bem mais complicado em algumas
outras distribuições), instalei o Kurumin 6.1 no computador que
funciona como gateway (PC100, Pentium III, 550 Mgz) e o Kurumin
7.1b no computador mais potente (PC3200, Athlon XP, 2400+). Ambos
funcionam perfeitamente, sem maiores problemas. Dentre todas as
versões do Kurumin até hoje, destaco a 4.1, que simplesmente
funciona em todos os meus computadores, até mesmo nos mais antigos
que estão encostados na estante como relíquias. E estou
entusiasmadíssimo com a 7.0b, que até o momento me parece perfeita
e de inicialização rapidíssima. Certo receio que tinha de ser o
Grub desta última versão mais complicado que o Lilo desapareceu
logo na instalação: é até mais simples e eficaz e permitirá maior
compatibilidade na instalação de outras distribuições em outras
partições.
Que mais dizer? A julgar pelo que ocorre comigo e vejo que ocorre
com as pessoas de minha família, que foram introduzidas por mim no
universo Linux, creio que o Linux veio para ficar e para mudar o
comportamento do usuário, que à medida que aprende vai se tornando
cada vez menos dependente de terceiros para resolver os naturais
problemas que surgem no seu computador. Hoje formatar, criar
partições, memória swap, Lilo, Grub, montar, desmontar,
descomentar, etc., vão se tornando termos naturais, do dia a dia
em minha família. E todos usam o Firefox como navegador e o
Thunderbird como programa de correspondência eletrônica. E todos
nos tornamos freqüentadores assíduos do Guia do Hardware, que é,
de longe, o melhor e mais completo site de distribuição Linux.
Nunca saí sem resposta do Guia, todas as vezes que tinha uma
dúvida. E muitas vezes fiquei mais tempo do que esperava, lendo
matérias interessantes que me provocavam a novas experiências.
Toda a informação para montar minha rede doméstica foi obtida com
a leitura de um dos artigos de Carlos Morimoto. E tenho certeza de
que, teimoso e curioso como sou, se continuar lendo com atenção,
aprenderei até a programar em Linux. Não há barreira para a
curiosidade e a determinação humanas.
Posso dizer, portanto, que minha viagem do sistema operacional
anterior para o Kurumin Linux foi sem escalas e sem retorno. Como
professor, poeta, pesquisador, revisor e ghost-writer, nada há
hoje, no outro sistema operacional, que eu não faça, com
muitíssima vantagem, no Kurumin. Sou hoje um defensor
intransigente do código aberto, que não apenas é muito mais
econômico, mas é mais democrático. E creio que se enquadra até
mesmo muito melhor na ideologia capitalista, pois em vez de
facilitar a dois ou três grupos multinacionais dominarem o mercado
e imporem suas regras (o que é politicamente bastante perigoso),
possibilita uma distribuição equitativa, permite que se criem
centenas de milhares de empresas e milhões de empregos em todo o
mundo, cria liberdade de ação e educa os usuários para a
liberdade.
É esse o universo Linux.
Rogério Chociay é professor do Curso de
Pós-Graduação em Letras da UNESP, câmpus de São José do Rio
Preto-SP. Autor do livro Pontuação, Ponto por Ponto (São Paulo:
Editora Íbis, 2005).